Por que os Laboratórios de Inovação falham?

Beny Rubinstein
8 min readJan 9, 2022

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E como garantir que o seu não seja o próximo fiasco?

Israel abriga mais de 6 mil startups inovadoras — além de 350 centros de Pesquisa e Desenvolvimento de companhias multinacionais que utilizam um modelo chamado de “inovação aberta”. A inovação aberta propõe uma verdadeira ruptura cultural corporativa, buscando livrar-se da “mentalidade de silo” das empresas — e quebrou muitos paradigmas existentes no mundo corporativo, mostrando que existem outros caminhos mais colaborativos e descentralizados para alcançar as metas inovadoras de uma companhia.

Como toda e qualquer metodologia de inovação, poderíamos dissertar por horas e horas sobre seus méritos e benefícios. Porém, apenas dois dias após aterrissar no Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim (o “Galeão”) e me deparar com estátua em tamanho natural (1,80m) de Nelson Rodrigues, na Praça Inhangá, em Copacabana, comecei a refletir sobre “A vida como ela é”: a realidade fora dos palcos de grandes eventos como a Conferência Anual de Startups e Empreendedorismo (CASE), cuja 8ª edição acaba de se realizar em evento 100% online devido à pandemia que perdura por quase dois anos.

Segundo a Harvard Business Review, os laboratórios de inovação (que muitas vezes possuem nomes diferentes — aceleradoras, incubadoras de negócios, centros de P&D) estão crescendo. Mais da metade do empresas de serviços financeiros iniciaram seus próprios espaços criativos, e você teria dificuldade em encontrar uma empresa de saúde ou varejista sem pelo menos um laboratório de inovação, seja uma sala de conferências com notas adesivas ou um espaço de incubadora de 20 mil pés quadrados. Isso é uma ótima notícia. Os laboratórios de inovação são um lugar seguro para as organizações realizarem experimentos e iterarem em projetos, e são um investimento importante para empresas que têm abordagens rígidas ou que trabalham em setores altamente regulamentados. Mas, a pergunta que não quer calar: eles realmente agregam valor e geram crescimento?

De acordo com Simone Bhan Ahuja, autora de “Disrupt-It-Yourself”, a grande maioria dos laboratórios de inovação não entrega o que promete (ó Nelson Rodrigues, por que você tem que estar certo?). De acordo com um relatório da Capgemini, até 90% dos laboratórios de inovação não cumprem suas promessas. Não tentarei elaborar sobre todas as razões (que, ironicamente, para serem resolvidas necessitam não apenas da criatividade de inventores e/ou da ousadia — “chutzpah” — de empreendedores, mas também de intraempreendedores experientes que sejam capazes de utilizar suas habilidades de empreendedorismo dentro de suas organizações e negócios a fim de inovar processos, serviços e produtos corporativos). Irei, sim, compartilhar alguns aprendizados de “vidas passadas” como intraempreendedor na Microsoft Corporation, como Head de Investimentos e aceleração de startups no primeiro parceiro da Microsoft Ventures na América Latina (aonde fui cofundador e CEO), e como executivo “C-level”, mentor e conselheiro em startups e corporações nas Américas e em Israel:

  1. “Context matters”: no vídeo postado pela Revista Bras.il em 21/11/2021, utilizo “Situational Leadership”, que enfatiza o fato de que muitos dos conceitos que aprendemos para gestão de pessoas e processos precisam ser adaptados dependendo do contexto. Frequentemente, é mais importante articular as “perguntas certas” do que buscar as respostas certas (para as perguntas erradas). Aliás, em nossa tradição judaica, no Seder de Pessach, lemos uma passagem da Torá que nos fala de quatro filhos: o sábio, o perverso, o tolo e aquele que não sabe perguntar. A Torá coloca o tolo e aquele que não sabe perguntar por último, pois a ignorância é algo muito grave.

Inovar dentro de uma corporação não é a mesma coisa do que inovar em uma startup. Desta forma, ainda que muitas vezes seja bastante tentador começarmos algo do zero (“Greenfield”) — muitas vezes em corporações a inovação precisa ser incremental e não necessariamente disruptiva. O que nos leva ao próximo ponto…

A inovação incremental ajuda a construir uma cultura propícia à inovação. As organizações mais inovadoras atribuem o mesmo valor as melhorias contínuas e incrementais porque entendem que o fomento inovação contribui significativamente para a criação de uma cultura de criatividade e de um mindset de progresso e mudanças dentro da organização (condição Sine Qua Non para o êxito da inovação corporativa).

Michael Jordan me lembra deste mindset: “Eu nunca perco. Ou eu ganho, ou aprendo!” — Nelson Mandela

1) A inovação ocorre quando três “pernas” se alinham. Pense em um banquinho de três pernas; basta uma delas estar um pouco mais curta do que as demais, e a queda é inevitável.

A primeira perna é a necessidade (representada pela demanda de clientes/mercado). Platão (filósofo grego) teria dito que “a necessidade é a mãe da inovação”. Segundo a Dra. Anita Sands (Professora de Empreendedorismo na Universidade de Princeton), a primeira tentativa do Royal Bank of Canada (RBC) em inovar com pagamentos móveis falhou pois apenas alguns segmentos de seus clientes estavam dispostos a adotar esta inovação (como tudo na vida, o timing da inovação também é essencial). A única coisa pior do que estar totalmente errado é estar certo, porém chegar cedo demais ao mercado. O que nos traz à terceira perna: a tecnologia emergente usada por uma startup precisa ser robusta, escalável e madura o suficiente para apoiar seu negócio e gerar o valor prometido e almejado.

Utilize uma “esteira rolante” (correia transportadora) de inovação, não um funil de inovação. O timing é uma das principais razões pelas quais a noção de um “funil de inovação” dentro de uma empresa ou corporação não funciona. Por sua própria natureza, um funil implica que muitas ideias vão para o topo com apenas algumas saindo do fundo depois de serem colocadas no “processo de inovação” da sua organização. Logicamente, as ideias que passam são aquelas em que as três pernas do banquinho não estão alinhadas ao mesmo tempo. Mas e se houvesse uma necessidade de mercado emergindo que simplesmente não estava desenvolvida o suficiente? Ou uma tecnologia promissora que ainda não maturou o suficiente? É muito comum uma ideia ser derrubada por outros com a lógica de que “olhamos para isso antes” ou “já tentamos isso e não funcionou”. Uma prática de inovação saudável envolve desafiar conclusões anteriores, reexaminar premissas antigas e manter a mente aberta para revisitar ideias quando as condições se tornarem mais propícias.

Em resumo, não são apenas as startups que têm uma chance de 90% de falharem; as iniciativas de inovação em grandes corporações com milhares de funcionários também possuem taxa de sucesso de cerca de 10%.

É preciso ser otimista, porém ser proativo, metódico e realista para inovar. “A vaca não dá leite” (temos que retirar o líquido dela) — já dizia o Prof. Mario Sergio Cortella em palestra clássica). Inovar requer muita disciplina, esforço, metodologia e um aprendizado contínuo — além de curiosidade, paixão e criatividade. Para ficar entre os 10% dos laboratórios de inovação que entregam resultados, vale focar em:

1. Alinhamento com o negócio: Algumas equipes de laboratórios de inovação parecem inseguras se são encarregadas de servir o negócio principal ou de interrompê-lo. Essa falta de estratégia é um sintoma comum de “teatro de inovação”: conselhos e líderes de C-suite anunciam laboratórios que são principalmente para “exibição” — para poderem dizer que têm uma equipe dedicada à inovação. No entanto, nestes casos, a cortina cai rapidamente, seja porque as ideias desses laboratórios são desconectadas das necessidades reais dos clientes ou porque ninguém está comprometido a levar as ideias até a implementação.

Os líderes precisam pensar sobre as implicações da abertura de um laboratório, decidir como ele complementará e/ou interromperá os negócios atuais e futuros — e fazer o difícil trabalho de determinar como novas ideias serão executadas. Para tanto, precisam comunicar claramente:

i. Visão. Criar metas claras para o laboratório ajuda tanto os intrapreneurs quanto os líderes da empresa a entender a direção e o propósito das iniciativas de inovação.

ii. Estratégia de Crescimento. O que acontece quando uma ideia foi validada e precisa continuar crescendo fora do laboratório? Foi este meu foco ao longo de uma década tirando tecnologias do Microsoft Research e as incubando em um modelo de comercialização onde pudessem crescer e prosperar — como foi o caso da plataforma de Nuvem e Inteligência Artificial (o “Azure”), aonde fui o 6º funcionário.

iii. Pessoas. Como o laboratório apoiará os intraempreendedores fazendo o trabalho árduo de apresentar novas ideias e executá-las em territórios “virgens”? Como o laboratório facilitará conexões próximas com os usuários finais ou clientes para os quais essas ideias resolverão um problema? As pessoas, juntamente com suas paixões e propósitos, estão no centro das iniciativas de inovação mais bem-sucedidas — e precisam de suporte (além de alinhamento de incentivos).

2. Métricas para acompanhar o sucesso: É certo que a inovação requer um pensamento diferente em relação ao apoio financeiro — os laboratórios precisam do espaço para iterar, evoluir e incubar ideias. No entanto, mesmo que seu laboratório seja um centro de custo com um mandato para experimentar a longo prazo, algum tipo de retorno, financeiro ou não, precisa ser especificado “A priori” e monitorado ao longo do tempo. Essas métricas servem para lembrar às pessoas que os benefícios da inovação vão desde o muito tangível (retorno financeiro do investimento) até o menos tangível, mas talvez mais valioso (retorno sobre o investimento na forma de novos conhecimentos e insights).

3. Equilíbrio e diversidade na equipe: Já vi mais de um laboratório falhar por ser liderado por um líder que tinha profundo conhecimento do setor e boas intenções, mas simplesmente não entendia como a inovação funciona. Esses líderes abordam a inovação da maneira como abordam a resolução de problemas no negócio principal, o que não gera muito valor. É preciso uma equipe diversificada para ter sucesso.

Beny Rubinstein é Engenheiro de Computação pela PUC-RJ e M.B.A. pela Wharton School da University of Pennsylvania, onde também atua como membro do Comitê de Admissão. Reside em Tel Aviv desde 2016 e atua em diversos Conselhos Consultivos para startups de Inteligência Artificial, Corporações e Fundos de Investimento no Brasil, Europa e Israel, além de atuar como mentor, palestrante e juiz de competições de startups em organizações como o MassChallenge no México e na América Central.

Foi co-fundador do grupo de incubação global do Microsoft Azure (Cloud & AI) e atua como Chairman do “Future of Health Summit” na Eslováquia.

Para acessar algumas palestras, visite WWW.BenyRubinstein.com

Leia online na Revista Bras.il: Revista nº 25 — Dezembro/2021 — Revista Bras.il (bras-il.com)

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Beny Rubinstein

Founding Team Member of Microsoft Azure currently working on disrupting AI/ML through AI for Genetic Algorithms that builds AI. Startup investor and adviser.