Crise global do COVID-19: mais uma prova de fogo para o ecossistema de empreendedorismo?

Beny Rubinstein
7 min readApr 3, 2020

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Israel há tempos é reconhecida como uma das nações mais inovadoras do mundo! No ano passado, Israel ficou entre as “top 10” até mesmo no Global Innovation Index das Organização das Nações Unidas (que historicamente é bastante crítica ao Estado de Israel). Com pouco mais de 9 milhões de habitantes, somos oficialmente uma crescente potência global!

Em artigos passados, comentei sobre desafios e histórias de sucess da chamada “Startup Nation” (marca estabelecida pelos autores Saul Singer e Daniel Senor em seu best-seller “Nação Empreendedora: O milagre econômico de Israel e o que ele nos ensinou”). No dia 13 de fevereiro passado, o tema principal de sua palestra foi como a Startup Nation tornar-se-á a “ScaleUp Nation”.

Pouco mais de 6 semanas se passaram e parece que estamos vindo em um filme de ficção científica. O mundo parou! Escolas, restaurantes, shopping centers — tudo fechado. Ainda que alguns considerem Raul Seixas um “profeta” (ele compôs “O dia em que a Terra parou” há mais de quatro décadas) e outros afirmem que Bill Gates já havia feito a previsão da pandemia em 2015, a realidade é que possivelmente nenhum de nós jamais tivesse imaginado que o nosso mês de março de 2020 seria assim. Israel, que conseguiu manter a taxa de desemprego abaixo dos 5% nos últimos quatro anos, repentinamente acordou com mais de 1 milhão de desempregados (em fevereiro o país tinha menos de 140 mil desempregados). Apesar de um programa econômico de 80 bilhões de shekel aprovado pelo governo, estamos longe de podermos exergar quando e como será o final dessa crise.

Ainda que seja inegável a criticalidade do momento que vivemos em 2020, algumas reflexões cabem:

1. Estratégia: Como a nação pode alavancar sua cultura empreendora para liderar uma reação a essa crise? E mais importante: como você pode utilizar esse momento para se posicionar?

2. Pessoas: Quem poderá ajudá-lo agora nessa transformação?

3. Tática: De que forma você pode utilizar seu tempo para sair por cima desta crise?

Antes de seguirmos com conselhos práticos, gostaria de usar um exemplo recente que ilustra como essa crise além de trazer riscos e incerteza também abre portas para utilizarmos algumas características de empreendedores e líderes efetivos para gerarmos valor usando o COVID-19 como uma janela de oportunidades. Há cerca de uma semana, enquanto empreendedores vislumbram que mais uma vez precisam ser ágeis e criativos para seguir tocando seus negócios, recebi uma mensagem de um nobre colega que foi parte do Conselho Administrativo da holding de investimentos onde fui CEO entre 2013 e 2016 pedindo permissão para usar uma frase que eu havia postado nas redes sociais como parte de uma iniciativa da qual ele estava iniciando. Sem hesitar, concordei de imediato; afinal de contas, se uma mensagem que eu havia escrito em 5 minutos enquanto “pensava com meus botões” isolado fisicamente no meu home office poderá ser útil a outros, por que não? Bem — o resultado prático foi de quem em 5 dias mais de 30 empresários, investidores, executivos e empreendedores situados no Brasil, Israel, Japão e Cingapura estávamos reunidos via Zoom dando início a um programa da X8 Investimentos visando ajudar aos empreendedores a passar por essa crise e gerando impacto positivo para a sociedade. Não somente alguns destes negócios já estão sendo transformado através desta rede de mentores voluntários (por exemplo, uma empresa que distribuia seus produtos através de lojas que agora estão fechadas hoje já está pronta a operar online, através de uma plataforma de comércio eletrônico, o que representará um valor nesse momento, porém persistirá como uma vantagem competitiva quando esta crise pandêmica. Outro corolário deste encontro virtual foram duas outras conexões que desenvolvi que podem ser de extremo valor para outra iniciativa global na qual venho trabalhando com uma organização no sul do Brasil, voltada à inovação na área de plásticos e polímeros.

Investidores, executivos e empresários se reunem via Zoom 5 dias após o início da iniciativa da X8 Investimentos.

Agora voltemos ao aqui e agora: quais são as melhores práticas para empreendedores neste momento? Lembra-se do slogan “Je suis Charlie” (“Eu sou Charles”) criado após o ato terrorista na sede do jornal satírico francês Charlie Hebdo como uma manifestação da população pela liberdade de expressão? Pois é. Hoje podemos dizer que “Somos todos empreendedores”. Quer você trabalhe, tenha trabalhado ou queira trabalhar em uma startup — ou não — somos todos empreendedores agora. Se antes do COVID-19 empreender era uma escolha voluntária e consciente — hoje é um estilo de sobrevivência. Precisamos todos nos reinventar — nossa carreira, nosso estilo de vida, nossa abordagem pessoal e profissional. Vamos dividir a abordagem baseando-se nos três pilares (estratégia, pessoas e táticas):

1. Entenda o “novo ambiente” em que vivemos e adapte-se; pratique a distância física — não o distanciamento social: O ser humano por natureza é resistente à mudança: porém temporarária ou permanentement, o mundo mudou. Em 2019, deixei uma multinacional onde gerenciava times de vendas espalhados por vários países do mundo através de ferramentas de comunicação como Microsoft Teams. Por mais que eu viajasse mais da metade do meu tempo, era inviável reunir toda a equipe em um mesmo local mais do que uma vez por trimestre. Muitas pessoas — tanto no mundo corporativo quanto no ecossistema de startups — insistiam que “não era possível gerenciar times remotamente”. Porém eu não tinha opções e busquei aprender com outros gerentes remotos quais eram suas “best practices”. Hoje — muitas atividades que jamais teriam sido consideradas “possíveis de serem feitas remotamente” já estão dando seus primeiros passos: desde educaçao (uma vez que as escolas estão fechadas) até aulas de religião e espiritualidade (ontem me “reuni” com cerca de 40 colegas do Mestrado em Wharton (situados em várias cidades dos Estados Unidos bem como na Europa, Ásia e América Latina) e tivemos uma sessão de meditação guiada por um colega de turma e ex-monge. Sábado à noite, juntei-me a um grupo de mais de 225 jovens em várias partes do mundo para ouvirmos músicas, bebermos alegremente e ouvirmos “Dvar Torah” (histórias da Torah). Antes do COVID-19, encontrava meus colegas de turma a cada 5 anos para o nosso “reunion” na Filadélfia, e eventualmente revia alguns colegas aqui e ali durante viagens curtas de negócio. Meus eventos judaicos limitavam-se ao espaço físico do Chabad on the Coast em Tel Aviv — onde não caberiam 200 pessoas e nem poderíamos contar com tantos convidados de outros países.

2. Intensifique seu professional network. Lembre-se que você não é o único nesta situação; a maioria das pessoas — inclusive aquelas que sempre estavam ocupadas demais para atendê-lo — estão passando por essa fase de transição. Com praticamente todas as viagens e reuniões presencias / eventos cancelados ou postergados, e o tempo de “commute” entre casa e trabalho reduzidos a zero, abriram-se várias lacunas nos calendários das pessoas. Esta é a hora de você listar aquelas pessoas com que tem algo a aprender, ou que podem ajudá-lo(a) neste momento — e requisitar uma breve conversa telefônica ou videoconferencia. Planeje-se, prepare-se, e otimize seu tempo.

3. Invista seu mais valioso ativo — seu tempo — em seu desenvolvimento. Lembra-se daquela entrevista para o seu “dream job” em que lhe perguntaram se você sabia programar em Python? Aquele projeto que não foi para frente porque você não sabia usar a ferramenta adequada? Aquele curso de Harvard que você sempre sonhou em fazer mas nunca teve nem tempo e nem dinheiro? Pois é. Uma grande quantidade deles estão disponíveis online e gratuitamente agora. Faça uma lista dos cursos e certificações que você necessita ou deseja. E comece a estudar! Perdemos temporariamente a mobilidade mas não a liberdade de aprender!

Não há sombra de dúvida: atravessamos uma das maiores crises do século. É natural sentirmos medo e insegurança. Há momentos que tudo que podemos enxergar é que nossos sonhos desmoronaram e nossa parnassá (sustento) está severamente comprometida. É difícil nos “inspirarmos” com fatos tais como Shakespeare e Sir Isaac Newton terem desenvolvido alguns de seus melhores trabalhos em quarentena. É difícil absorvermos o fato de que Viktor E. Frankl, autor de “Man’s Search for Meaning” tenha recebido inúmeros prêmios por sua pesquisa no âmbito da psicologia desenvolvida durante 3 anos em que passou por 3 campos de concentração incluindo Auschwitz e Dachau. Sim — são tempos de uma certa “escuridão”. Temos menos clareza com relação a que futuro nos espera. Precisamos estar alertas para o fato de que é preciso ter calma, estratégia, e uma execução consistente de um plano durante este período para navegarmos o mar de incertezas. Quem já empreendeu certamente sabe disso. Quem ainda não: seja bem-vindo ao clube! Lembre-se de que quando uma porta se fecha, pelo menos outra se abre. As escolas e escritórios estão fechados, porém a internet ainda nos conecta. Os corações humanos estão abertos. Os abraços não são permitidos, mas muitos estão de braços abertos.

E agora, o que fazer? Bem — as opções pré-COVID-19 talvez estejam indisponíveis no momento. Mas como dizia Peter Drucker, um dos gurus de gestão: “A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo”. Vamos lá?

Beny Rubinstein (Beny.Rubinstein.WG01@Wharton.UPenn.Edu) é Engenheiro de Computação formado pela PUC-RJ e Mestre em Finanças e Planejamento Estratégico pela Wharton School da University of Pennsylvania. Atualmente reside em Tel Aviv e atua em diversos Conselhos Consultivos para startups de Inteligência Artificial, Corporações e Fundos de Investimento.

Especial para Bras.il — https://www.bras-il.com/revista-no-15-abril-2020/

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Beny Rubinstein

Founding Team Member of Microsoft Azure currently working on disrupting AI/ML through AI for Genetic Algorithms that builds AI. Startup investor and adviser.